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Até sempre, Evaristo

Opinião

Quando chego, ao meio-dia e dez de segunda-feira, estão três velhotes ao balcão. São, como tantos outros, clientes assíduos, daqueles que já fazem parte da mobília. Tudo está no seu sítio, eles e o resto. A tv está ligada a um canto. Nas prateleiras à minha frente estão pousadas garrafas de Macieira, São Domingos, Ginja, Licor Beirão. Um pequeno letreiro colado à parede avisa “não há multibanco”. Ao lado, pedaços de papel têm rabiscados os pedidos de reserva. Os velhos pósteres do Beira-Mar e a fotografia do Evaristo sempre tiveram lugar cativo.

Discute-se o vinho derramado em Anadia. “Até admira não estar ninguém a lamber a rua”, diz alguém - é um divertimento escutar as conversas dos frequentadores regulares e a forma como interagem entre si e com os funcionários. Mas, além do trivial, discute-se também o mais sério dos assuntos: o fim do Evaristo. Meio a sério meio a brincar, um cliente diz que vai lançar uma petição para a casa não fechar.

O senhor Zé põe-me a ementa à frente. Peço caldo verde, jaquinzinhos com arroz de feijão e um fino. Pergunto-lhe se é mesmo verdade. “Sim. E fechamos de vez”, responde. O restaurante abriu em 1967. Encerra no fim do mês.

O Evaristo é uma instituição de Aveiro. Nada nem ninguém dura o suficiente para sequer roçar a eternidade. Um dia, regressamos ao pó.Mas o fim de relíquias como o Evaristo provocam um sobressalto– qualquer coisa de importante e de essencial vai-se perder.

As cidades precisam de referências onde os habitantes se reconheçam e que as tornem únicas, e não meras cópias umas das outras. As referências não são só monumentos, edifícios ou locais emblemáticos. São também lugares como o Evaristo.

As cidades são entidades vivas, dinâmicas e complexas e, entre tensões e interesses dissonantes, devem saber equilibrar o novo com o velho o melhor possível. Eu, que não sou urbanista nem arquitecto nem político nem comerciante nem proprietário, mas um simples habitante, percebo como desenvolvimento ou crescimento são conceitos ambíguos que não geram consensos, antes tensões e conflitos. O que para uns é progresso para outros é retrocesso.

Certo é que a cidade tem perdido elementos identitários históricos: a Vivenda Aleluia foi o último exemplo. Somem-se o estádio, a Vitasal, a Salineira Aveirense, a Casa Fernandoe tantos outros. No velho comércio, o que sobra? A Casa Pergentino nas 5 Bicas, o Bazar Valente na Avenida, duas ou três lojas na Rua Direita ou nos Arcos.

É a cidade a funcionar – sempre foi assim e sempre será. No lugar do que fecha mil novas coisas florescerão. As referências não nascem referências, vão-se construindo. As gerações mais novas, para quem o Evaristo nada dirá, construirão as suas próprias. Também o Evaristo, nos seus primórdios, era um poiso como outro qualquer, na sua modesta banalidade. Até que deixou de ser e se tornou em algo especial.

Aveiro está a reinventar-se ao sabor das actuais dinâmicas políticas, imobiliárias, turísticas, ambientais, laborais, etc. Está a fazê-lo bem ou mal, para melhor ou para pior? Cada um dirá.

Um amigo, o Zé Alexandre, comenta sobre o Evaristo: “eles já eram velhos eu era novo”. Por mil e uma razões, as coisas acabam. Mas será estranho passar pela Rua 31 de Janeiro e não encontrar o maravilhoso Evaristo, que nunca mudou de nome para Evaristo’s House, onde a Vitela à Vouga não foi rebaptizada para um nome com oito palavras, onde não se usam guardanapos de pano e onde as contas são feitas à mão na toalha da mesa. Acabo o almoço e o senhor Zé faz a conta. São 10 euros bem gastos, em honra de todos aqueles que por lá passaram, atrás e à frente do balcão. Despeço-me do Evaristo com os dedos a saber a peixe frito. Foi um gosto. Até sempre.

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