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Bruno Seco: “Não estou no futebol para formar jogadores, mas sim para formar pessoas”

Sociedade

Aos 48 anos, Bruno Seco é coordenador da escola de futebol do Taboeira e selecionador nacional de Futebol de Rua. Dentro e fora das quatro linhas, Bruno utiliza o desporto – em especial, o futebol – como ferramenta de inclusão social e de promoção do desenvolvimento pessoal, um meio para atingir algo bem maior do que qualquer sucesso desportivo: a formação humana. É também treinador mental e autor do livro “Mentalidade SIIIGAAAA – O poder da autoliderança servidora”.

Bruno Seco nasceu em 1975, em Vila Nova de Foz Côa. Mudou-se para Aveiro com cerca de 10 anos e foi nas ruas do bairro da Beira-Mar que, na companhia de amigos, começou a jogar futebol. “Em Aveiro, tive a sorte de encontrar duas vizinhas que, tal como eu, gostavam muito de futebol. A rua era o nosso campo e as balizas, limitadas por pedras da calçada, tinham de ser destruídas de cada vez que um carro queria passar. Ao fim de semana, aproveitávamos para ocupar o campo da escola primária e passávamos os dias a jogar”, recorda. Naquele grupo de amigos da Beira-Mar, a primeira a demonstrar vontade de levar o futebol um pouco mais a sério foi Ana, uma das suas vizinhas, mas no clube da terra “disseram-lhe que o futebol não era para meninas”. Já a Bruno, desafiaram-no para experimentar um treino. Gostou. Com 12 anos, ingressava, assim, nas fileiras do Sport Clube Beira-Mar.

Bruno nunca foi de admirar ídolos ou colecionar recordações. Ainda assim, dos anos que passou no Beira-Mar, há um episódio – “dos únicos”, garante – que lhe ficou vincado na memória e que ainda hoje lembra com carinho: “O meu pai nunca foi ver nenhum jogo meu, mas houve um certo dia em que, de surpresa, apareceu para assistir a um treino. Lembro-me de olhar para a bancada, de perceber que ele lá estava e, poucos segundos depois, ter marcado um golo. Foi um remate instintivo, de primeira, de fora da área. Um golaço! Quando cheguei ao carro, o meu pai deu-me os parabéns e mostrou-se orgulhoso do meu talento para a bola”, narra Bruno. “Eu sabia muito bem que não era assim tão bom, que aquilo tinha sido só um remate feliz. Mas o importante é que ele tinha lá estado para me ver. Foi a primeira e única vez, mas chegou para me marcar até hoje”, partilha.

A verdade é que Bruno nunca ambicionou tornar-se futebolista. Jogava por diversão, porque lhe fazia bem. Assim, aos 18 anos, numa altura em que a possibilidade de representar o escalão sénior começava a impor-se, deixou o clube. Aposta na licenciatura em Desporto e Educação Física na Escola Superior de Educação, em Viseu. No segundo ano, todavia, apercebendo-se que o caminho mais óbvio para os recém-licenciados daquela área era o ensino básico, muito provavelmente, o 1.º ciclo, interioriza que aquele também não era o caminho. “Não me estava a ver fechado numa sala a dar Estudo do Meio e Português. Acabei o curso, cumpri os estágios, mas nunca cheguei sequer a candidatar-me para dar aulas numa escola”, relata Bruno Seco. “Preferi a estabilidade, preferi ficar por Aveiro”, acrescenta. O primeiro emprego que teve foi como monitor de natação nas piscinas municipais de Vagos e nas piscinas do Beira-Mar. Mais tarde, em 2001, surge a oportunidade de trabalhar na área social, integrando, como professor de desporto, uma equipa de apoio a toxicodependentes de uma IPSS que lidava de perto com crianças, jovens e famílias do bairro de Santiago, em Aveiro. “Trabalhei 16 anos nessa IPSS. Acompanhava os miúdos do bairro, dava aulas aos idosos do centro de dia, promovia campos de férias”, enumera Bruno. Paralelamente, foi também preparador físico dos reclusos no estabelecimento prisional de Aveiro, experiência com a qual, segundo o próprio, aprendeu mais do que aquilo que ensinou. “Trouxe de lá lições de vida importantíssimas”, admite. Aprendizagens sobre “igualdade” e “respeito”, sobre “a importância do medo e da dúvida”, assim como verdadeiros tratados sobre felicidade e sonho. “Havia gente verdadeiramente feliz lá dentro e eu, a princípio, estranhava essa felicidade. Explicavam-me: ‘O que está aqui preso é o meu corpo. A minha cabeça anda por aí’ e isso fez-me perceber que a nossa realidade não é só o que está à nossa volta, mas onde conseguimos chegue a nossa mente”.

Como é normal em contextos de particular fragilidade e desfavor, também ali o Desporto revelou o seu verdadeiro poder enquanto ferramenta de inclusão. Bruno Seco sentia-se particularmente “útil”. “Sentia que estava a contribuir para o bem daquelas pessoas. Muitas vezes, limitávamo-nos a fazer piscinas no pátio da prisão. Para a frente e para trás, só a ouvi-los. Com o agradecimento que eles me davam, com os abraços que partilhávamos, saía de lá a sentir que tinha contribuído não tanto para o desenvolvimento físico, mas para o desenvolvimento emocional, afetivo e do caráter daquelas pessoas. O mesmo acontecia com os miúdos do bairro”. “Não estou no futebol para formar jogadores, mas sim para formar pessoas. Jogadores, na melhor das hipóteses, um ou dois poderão sê-lo. Pessoas sê-lo-ão todos, de certeza. No Desporto, sempre me interessou mais trabalhar valores, competências sociais, autoestima, caráter e a capacidade de sonhar. É isso que me interessa”.

"Siiigaaaa!"

Em 2021, Bruno Seco publicou “Mentalidade SIIIGAAAA – O poder da autoliderança servidora”, livro com o qual, dando a conhecer a sua história e o seu exemplo, inspira os leitores a abraçarem um “processo de treino mental que remove as desculpas do caminho” e permite que se tornem “capitães da sua própria vida”.

“Siga” é, antes de mais, uma das interjeições que – asseguram os atletas e todos quantos lhe são próximos – Bruno mais utiliza para incitar alguém – muitas vezes, a si próprio - a continuar, a não desistir. “No desporto e na vida, ‘siga’ é uma palavra que não me permite negociar comigo mesmo. Ao fim de poucos segundos, a nossa cabeça já arranjou uma série de desculpas para não fazermos alguma coisa, para não darmos o passo em frente. ‘Siga’ é o gatilho mental que não deixa que os meus sentimentos resistentes levem a melhor”, resume. No contexto do treino mental, SIIIGAAAA – assim mesmo, em maiúsculas, com três is e quatro ás – serve igualmente como o acrónimo que reúne os passos essenciais do processo de treino mental que criou: Sonhar, Investir, Insistir, Interiorizar, Garantir compromisso, Aliar, Avançar, Atrever e Alcançar.

À boleia de um ou outro caso mais mediático, nos últimos anos, este universo do treino mental tem vindo a expandir-se. Ainda assim, “continua a haver quem ache que isto é vender banha da cobra”, reconhece Bruno, “muito por causa de alguns autoproclamados coaches motivacionais” ou “de alto rendimento”, tudo expressões que o aveirense abomina: “Detesto que me intitulem coach. O coaching é a arte de fazer perguntas, mas não passa disso. Eu sou treinador – partilho experiências, gosto de dar opiniões e de mostrar o caminho que percorri”, esclarece. “Também não gosto do chavão ‘alto rendimento’. Prefiro focar-me no autorendimento, isto é, tu tirares o máximo rendimento de ti próprio. Quando uma pessoa vem com fórmulas mágicas tentar vender-me um sucesso que essa pessoa nunca alcançou para si, desconfio logo”. Por fim, diz Bruno, “não tenho paciência para showoffs daqueles palestrantes motivacionais que estão sempre a tentar vender-nos alguma coisa e que nos dizem que a vida é uma maravilha. Passa 14 anos na cadeia que tu vais ver a maravilha que é a vida”, escarnece, acrescentando: “Quanto à motivação, é efémera. Até podes ir a um evento desses e sair de lá capaz de mudar o mundo, mas três dias depois já voltaste à tua rotina”. “Eu defendo uma transformação da forma de pensar e isso só se faz com o treino, repetição e insistência”, conclui.

O que é, afinal, um treinador mental? A resposta é muito simples: “Da mesma forma que um treino físico é a repetição de um movimento e um treino tático é a repetição de uma movimentação, um treino mental é a repetição de um pensamento. E a pessoa que orienta esse treino é um treinador mental”, resume Bruno Seco. “Um treinador mental é alguém que ajuda outras pessoas a pensarem da maneira que essas pessoas gostariam de pensar, é alguém que ajuda a tornar automáticos pensamentos que, para essas pessoas, não o são, nomeadamente, no que respeita a amor próprio e autoconfiança”, elabora.

O Futebol de Rua

Por volta do ano de 2008, Bruno conhece o Futebol de Rua, “um projeto de inclusão social através do Desporto (neste caso, focado no futebol) destinado a quem se encontre ou já tenha passado por situações de fragilidade social”. Foi campeão distrital, campeão nacional e, em 2011, torna-se Selecionador Nacional de Futebol de Rua. Desde aí, já levou Portugal ao título de campeão europeu em 2016 (Inglaterra), à vitória no mundialito de 2022 (Espanha) e arrecadou a distinção de Melhor Treinador do Mundo de Futebol de Rua, em 2017.

“E este ano vamos ser campeões do mundo”, sublinha Bruno Seco, convicto. Para o treinador, o sonho é possível. Bastará, para isso, trabalhar o controlo emocional. “Por norma, em campo, ninguém nos ganha. Mas chegamos ao ‘mata-mata’ dos penáltis e perdemos sempre. E não é por falta de treinar penáltis! Nesses momentos decisivos, as pernas não podem tremer. Tenho de lhes tirar o medo de errar, de falhar, e acredito piamente que estou preparado para isso”, confia Bruno. “Este ano, é nos Estados Unidos e vamos lá buscar o sonho americano para Portugal. Vamos para estágio a 27 de junho, partimos para a Califórnia a 5 de julho, o campeonato é de 6 a 16 de julho e dia 17 chegamos a Portugal com a taça”, aponta com a certeza de que, se ainda não for desta que o sonho se torna realidade, na próxima oportunidade, estará ainda mais forte, ainda mais bem-preparado e, claro, ainda mais convicto que a vitória não lhe escapará.

É caso para dizer: “Siiigaaaa!”

*Foto: Afonso Ré Lau

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