José Carlos Mota *
Foi com alguma preocupação que li esta notícia do Jornal de Notícias ("Câmara de Aveiro planeia hotel na antiga lota") sobre a pretensão de ocupação dos terrenos públicos da antiga Lota.
Escrevi, há uns meses, que não há muitas cidades no mundo que disponham de um parque natural a dois passos do seu centro. Na verdade, não é bem um parque natural porque parte dele foi construído pelo homem, num equilíbrio raro e delicado com a natureza. Uma das obras arte produzidas são as marinhas de sal, um dos engenhos mais belos do mundo, merecedor de distinção equivalente.
Hoje em dia, nem todas as marinhas produzem sal, algumas estão adaptadas a novas funções. Assim de memória existem uma praia urbana e casas lacustres para turismo (Marinha da Noeirinha), spa’s salinos (Cale Do Oiro - Salinário), produção de ostras (Ostraveiro - Aquacultura e Turismo), piscicultura, produção de salicórnia e percursos de natureza (Ilha dos Puxadoiros).
As margens destas marinhas acolhem equipamentos importantes como o Centro Municipal de Interpretação Ambiental e vários centros náuticos e de canoagem, assim como os Passadiços da Ria, que trazem públicos importantes e diversificados a esta área.
Temos, infelizmente, vários edifícios devolutos (antiga lota, antigo TIR TIF) e muitos terrenos de terra batida que transmitem uma imagem desqualificada não compatível com a beleza natural da envolvente.
Quase sem darmos conta, foi-se desenvolvendo uma espécie de “cidade lacustre” um pouco desorganizada, em algumas zonas de acesso excessivamente motorizado, mas com enorme potencial.
Face às notícias da eventual transferência dos terrenos da antiga Lota para o município, talvez esteja na altura começar a planear coletivamente este território e a integrá-lo de forma plena como um parque natural e urbano único de Aveiro, com tamanho equivalente a cinco vezes a dimensão da cidade. O Parque das Marinhas podia transformar-se num desígnio comum, num objetivo que nos una e mobilize pelo futuro de Aveiro mas não deve ser projetado de forma avulsa de acordo com alguns interesses particulares.
As marinhas são um património público de todos! O seu futuro deve ser pensado coletivamente.
* Docente da Universidade de Aveiro