A história do amanhã. Foi este o mote escolhido para a décima edição do TEDxAveiro, um programa de eventos organizados de forma independente que, de todas as vezes, procura celebrar a criatividade e inspirar à ação a comunidade local. A mensagem é clara: a construção do futuro – de todos e para todos – deve ser iniciada hoje. Deve ser tingida de um azul permanente, não confortável mas sim desconcertante, embrionário, ativo e radioativo.
O programa prometia dez talks, com oradores de diferentes backgrounds, e duas perfomances de artistas nacionais – Gerson Batista e Butchers Brass Band –, mas acabou por presentear o público com algo mais poderoso, de um azul mais vibrante. Ali, no auditório do Centro de Congressos de Aveiro, no dia 25 de maio, quebrou-se o status quo. Abriram-se as portas a cerca de 700 pessoas de olhos e ouvidos atentos e subiram ao palco ideias visionárias que, mais do que merecerem ser partilhadas, merecem ser postas em prática.
Conversas estimulantes e desafiadoras, partilhas de quem passou ou ainda passa pelo backstage, Cafés das Ideias tomados em boa companhia, acordes de fazer arrepiar os sentidos, apontamentos com humor, até um elogio ao dinamismo aveirense por parte do presidente da Câmara. São vários os momentos que ficarão, com certeza, gravados na memória dos participantes e de todos os voluntários que tornaram possível o evento.
O balanço é positivo: sim, é possível escrever a história do amanhã a tinta azul permanente. Um amanhã em que os oceanos pertencem aos seres que neles habitam, em que as escolas são espaços seguros e inclusivos, em que todos nós nos agarramos, com valores em braços, a um Plano A.
Um amanhã sustentável
No time to waste. Foi esta a mensagem deixada por Claire McNulty, atual diretora da secção de investigação da National Geographic Society na Europa, e reforçada por Diana Madeira, investigadora de pós-doutoramento na Universidade de Aveiro que se dedica ao estudo dos impactos das alterações climáticas na biodiversidade.
Com a mesma nota de urgência, sem limites impostos à imaginação, Dal & Mike colocaram-se no círculo vermelho do palco para, mais uma vez, tornarem visível o invisível. Com o projeto Trash Isles, as duas mentes criativas desafiaram a Organização das Nações Unidas a reconhecer a acumulação de lixo no Pacífico como um país oficial. A Aveiro, touxeram a imagem da moeda, da bandeira e até dos rostos de alguns dos cidadãos destas ilhas onde o plástico reclama para si os oceanos.
Um amanhã de cidadania digital
O apelo é simples: que o ser humano seja cada vez mais humano num mundo cada vez mais tecnológico. Numa TED Talk projetada no auditório, a jornalista Carole Cadwalladr sublinhou que a democracia não é garantida ou inevitável e que nos cabe a nós, cidadãos globais, lutar para que as empresas tecnológicas tenham de agir de forma transparente.
João Pina, fundador da VOST Portugal (Voluntários Digitais em Situações de Emergência) e responsável pela criação da plataforma fogos.pt, é o exemplo de que a cidadania digital se afirma como uma nova forma de atuar. Em palco, por entre a complexidade dos sistemas operativos, explicou a importância de sermos tão conscientes no ecrã quanto fora dele.
Nesse sentido tem trabalhado também António Neves, recentemente distinguido pela NATO Strategic Communications Centre of Excellence pela contribuição no desenvolvimento de um sistema de deteção de conteúdos online de caráter malicioso. No TEDx, desafiou o público com imagens descontextualizadas e modificadas, em jeito de alerta para um consumo crítico do conteúdo em rede.
Um amanhã inclusivo
Académica e ativista, Cristina Roldão dá voz ao debate sobre o racismo em Portugal, legado colonial que hoje se faz sentir na Educação. "É difícil combater algo que não se vê", disse, no sábado, a propósito das escolas segregadas onde não há monitorização, "mas é possível". Basta que todos nós usemos as capas de super-heróis e heroínas movidos a esperança de que falou Daniel Traça, diretor da Nova School of Business and Economics. Seres dotados de poderes e valores que, nas palavras de Jo Clayes, entusiasta belga da Educação Não Formal, "não devem tornar-se meros slogans ou sequências de letras".
Uma dessas super-heroínas, que não voa mas corre atrás de sonhos, é Carolina Duarte, atleta paraolímpica e protagonista de um dos momentos mais marcantes do evento. Com 10% de visão e várias medalhas conquistadas, garante que é genuína a sua convicção de que este é o plano que a faz feliz – o seu plano A que, falhando, teria de ser substituído por um novo plano A.
Um amanhã em que regamos e somos regados
São os artistas que, nesta metáfora, têm na mão as sementes e o regador mas, porque "ouvir não chega", é necessário que seja também o consumidor de cultura a colocar mãos, pés, braços e ideias em movimento. Foi este um dos desafios lançados por Martim Sousa Tavares, jovem maestro que acredita que a arte tem o poder de mudar a sociedade. Para o músico, que desconstrói mitos e lança sementes sob a forma de acordes, a fruição ativa da arte – em que esta não é um ponto de fuga ou de alívio mas de desafio e interpretação – provoca o debate, conferindo infinidade às obras, e conduz à construção coletiva do conhecimento. Acrescente-se, à construção da história de um amanhã em que a Humanidade é comum e atenta a si mesma e ao planeta.
Fotografias: TEDxAveiro