Fevereiro de 2020. Estreava, no Teatro Nacional D. Maria II, o espetáculo Romeu e Julieta, encenado por John Romão. Uma versão completamente diferente do clássico de Shakespeare que mais parecia adivinhar os dias e os meses que acabaram por se seguir. “O mundo distópico e longínquo que eu tinha plasmado neste espetáculo, e que achava que era uma coisa em risco de acontecer daqui a muito tempo, aconteceu duas semanas depois. O mundo em que não há toque físico, em que as relações são estabelecidas a uma distância física entre os corpos, com as relações mediadas pela tecnologia, confirmou-se com a pandemia”, introduz o encenador e programador, em conversa com a Aveiro Mag, poucos dias antes de apresentar “Romeu e Julieta”, em Aveiro (sábado, 21h30, no Teatro Aveirense).
Nesta versão da clássica tragédia amorosa, não há toque, não há beijos nem lutas, tal como as conhecemos. Tem de ser inventado um novo lugar para o encontro entre Romeu (João Cachola) e Julieta (Mariana Monteiro). Coincidência com os dias de hoje? Premonição? John Romão prefere classificá-la como “uma espécie de profecia”, mas que não imaginaria que acontecesse tão rápido.
“O universo visual que o espetáculo propõe aponta para uma espécie de outro tempo e de outro lugar, com cinco intérpretes numa espécie de efeito de ilusionismo com os seus corpos em suspensão – e há três outros intérpretes que estão em movimento constante -, lugar esse não definido. E é muito interessante perceber qual é a consonância dessas imagens com as palavras de Shakespeare”, desvenda o encenador.
No fundo, o que se propõe ao espetador é que “exercite ele também uma espécie de configuração do seu próprio lugar hoje no mundo, em que as nossas relações já não são as daquele romantismo que o texto propunha, com uma cena romântica à varanda, etc. Hoje são muito mais mediadas por Whatsapp, Zoom e outras aplicações”, refere John Romão.
Apesar de ainda não contar com muitas apresentações ao público – a pandemia acabou por suspender várias exibições -, o espetáculo tem sido bem acolhido pelo público. “O espetador já vai para este espetáculo armado, porque já tem os seus próprios recursos da imaginação – quando estamos a falar de Romeu e Julieta, estamos a falar de um imaginário, de uma ficção -, e as reações têm sido interessantes”, transmite o encenador.
“Romeu e Julieta” tem dramaturgia de John Romão e Marta Bernardes, contando com a interpretação de Mariana Monteiro, João Cachola, André Garcia, João Arrais, Joãozinho da Costa, João Jesus, Mariana Tengner Barros e Rodrigo Tomás.
Os bilhetes para a sua apresentação no Teatro Aveirense custam 5 euros.
No dia seguinte, domingo (16h00), John Romão voltará ao Teatro Aveirense para participar no ciclo “À Boca de Cena”, que compreende sessões de leitura partilhada com o público, em registo informal e acolhedor, com a participação do próprio autor ou de artistas convidados das mais diferenciadas áreas. John Romão irá ler “Morro Como País”, texto escrito em 1978 por Dimítris Dimitriádis, que Mickael de Oliveira adaptou para a encenação de John Romão em 2011.