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Filipe Carvalho: Do futebol à cozinha, um chef de futuro

Gastronomia

Filipe Carvalho, 34 anos, cresceu no restaurante dos avós, mas assumir que foi essa vivência a despertar-lhe a vocação pela gastronomia soa-lhe a cliché. Afinal, naquela altura, “como qualquer miúdo, o sonho passava por ser jogador de futebol”. Filipe estudava durante o dia, treinava na Associação Desportiva da Taboeira à noite e, nos tempos livres, ainda “ajudava a cortar as batatas ou a levantar as mesas” n’O Rodrigo, o restaurante da família.

Quando terminou o ensino básico, foi trabalhar para as pastelarias do tio e depressa percebeu que, em alternativa aos relvados, talvez o seu futuro pudesse passar pela pastelaria. É com esse intuito que se inscreve na Escola de Hotelaria e Turismo de Coimbra, onde, ao fim de três anos, completaria o curso de técnico de cozinha e pastelaria. “A ideia inicial era mesmo especializar-me em pastelaria, mas à medida que o curso foi avançando, comecei a enveredar cada vez mais pela cozinha”, conta Filipe Carvalho, em entrevista à Aveiro Mag. Hoje em dia, apesar de se dedicar aos pratos salgados, Filipe continua a nutrir um gosto especial pela pastelaria que entende como “um complemento fundamental ao trabalho de qualquer chef”.

Os estágios curriculares que cumpriu no Hotel D. Inês, em Coimbra, e no Grande Real Santa Eulália Resort & Spa, no Algarve, foram apenas o pontapé de saída de um percurso que rapidamente viria a revelar-se repleto de projetos gastronómicos diferenciadores, influências de renome internacional e sabores de fazer crescer água na boca.

Depois de terminar o curso, no verão de 2006, Filipe teve uma curta passagem pelo Quinta da Romeira, em Coimbra, um restaurante que o chef José Luís Lavrador, um dos seus formadores na escola de hotelaria, estava a abrir. José Luís Lavrador, pai do também chef Luís Daniel Lavrador – que tem os restaurantes Fama, em Aveiro, e Marina, no Jardim Oudinot, na Gafanha da Nazaré –, destacou-se por ser o primeiro cozinheiro em Portugal com um doutoramento na área, bem como pelos largos anos que passou enquanto chef oficial da seleção nacional de futebol.

Por falar em seleção nacional, foi precisamente quando estava a trabalhar com o chef Lavrador que Filipe foi convocado para a seleção nacional... de culinária!

Integrado nas equipas de competição culinária (júnior e, mais tarde, sénior) da ACPP – Associação de Cozinheiros Profissionais de Portugal –, e comandado pelo mister – perdão, pelo chef – António Bóia (com quem, entretanto, Filipe tinha vindo trabalhar no restaurante Rio’s, na marina de Oeiras), o aveirense chegou a representar as cores nacionais em dois campeonatos do mundo, no Luxemburgo, e umas olimpíadas da culinária, na Alemanha. Pelo meio, teve ainda uma experiência em Nova Iorque, no Westchester Country Club, com o chef Edward G. Leonard, antigo responsável pela seleção norte-americana de culinária.

Regressado a Portugal, Filipe trabalharia ainda com chefs como Paulo Morais – com quem se aventurou na cozinha japonesa –, José Cordeiro – aquando de uma primeira passagem pelo hotel Altis, em Belém, onde assumiu o Sushi Bar – Vicent Farges – na Fortaleza do Guincho, notável pela sua “cozinha de base francesa” e o primeiro restaurante com estrela no Guia Michelin (uma das mais importantes distinções do mundo da gastronomia e da restauração) onde Filipe trabalhou – e Dieter Loschina – no Vila Joya, no Algarve, onde chegou a ser convidado para sub-chef júnior, cargo que recusou por ainda não se sentir preparado para assumir uma função de liderança.

Todos os chefs com quem lidou “têm formas de trabalhar e visões diferentes” sobre a cozinha. A uni-los está “a exigência, a persistência e o perfecionismo” que Filipe foi bebendo ao longo dos anos e que, a cada dia, tenta empregar no seu trabalho. “É a procura pela excelência que faz de nós bons profissionais. Quando chega a altura de nos tornarmos chefs, sabemos que temos de ambicionar sempre o melhor”, atesta Filipe.

No início de 2014, estava de regresso ao hotel Altis, em Belém, desta vez, para assumir a posição de souschef de João Rodrigues, que tinha assumido os comandos depois da saída do chef Cordeiro. O compromisso era de ficar apenas um ano, já que Filipe ainda ambicionava uma nova experiência internacional antes de se fixar num projeto. Foi durante esse período, num evento gastronómico em Banguecoque (Tailândia), que a equipa do consagrado chef MartínBerasategui, acabaria por conhecer o trabalho de Filipe. Pouco tempo depois, surge o convite para ser sous chef no seu restauranteLasarte, em Barcelona.

Era a oportunidade pela qual Filipe estava à espera. Era tempo de arriscar. Recuperando uma expressão tão típica da linguagem do futebol, era altura de “pôr a carne toda no assador”. E Filipe assim fez: muda-se para Espanha, ajuda o Lasarte a ganhar a terceira estrela Michelin, faz consultoria a um restaurante de cozinha tradicional portuguesa em Hong Kong e ainda assegura, já como chef executivo, a abertura do luxuoso Hotel Monument, também em Barcelona.

As experiências em Espanha são de uma intensidade impressionante. Porém, a certa altura, Filipe sente necessidade de voltar a casa. Quando informa Berasategui que estaria prestes a voltar para Portugal, o espanhol terá respondido: “Se vais para Portugal vou abrir um restaurante em Portugal”.

Martín Berasategui, um dos maiores ícones da gastronomia mundial, detentor de um record de 12 estrelas Michelin nos vários restaurantes a que empresta o nome, queria Filipe como seu braço direito no seu primeiro restaurante em Portugal. “Na altura, pensei que me estivesse a dar gozo”, confessa Filipe, mas a verdade é que o chef basco já estava em negociações com o grupo Sana com vista a abrir um espaço em Lisboa. Se fechasse acordo com o grupo hoteleiro, Berasategui comprometia-se a entregar a liderança do novo restaurante a Filipe. E assim foi.

Cinquenta segundos (fifty seconds, em inglês) é o tempo que o elevador da Torre Vasco da Gama, em Lisboa, demora a chegar do rés-do-chão ao último andar. É lá, a 120 metros de altura, com uma vista panorâmica de 360º sobre o Tejo e o Parque das Nações, que, desde novembro de 2018, mora o Fifty Seconds by Martín Berasategui, um sofisticado restaurante liderado por Filipe Carvalho.

O prestígio de uma casa com a assinatura de Martín Berasategui é inquestionável. No entanto, a identidade das sugestões gastronómicas que ali se apresentam vem da experiência, das vivências e da criatividade de Filipe e da sua equipa. É o próprio chef espanhol que assim o exige e foi por isso que fez questão de deixar aquele espaço entregue a mãos portuguesas. Como não podia deixar de ser, foi buscar os melhores: Filipe Carvalho é chef executivo e da equipa fazem ainda parte Maria João Gonçalves, chef pasteleira, Inácio Loureiro, chefe de sala e Marc Pinto, sommelier (escanção).

Sem abandonar o espírito do fine dining que o caracteriza, o Fifty Seconds tem no peixe e marisco as suas matérias-primas de eleição. São estes, na opinião de Filipe, “os produtos portugueses de maior qualidade e consistência”. “Tudo o que é ameijoa, berbigão, ligueirão ou ostra, por exemplo, vem de Aveiro”, assegura o chef aveirense. “A ria é muito rica e tem um ponto de sal muito equilibrado”, elogia.

Falar em Aveiro, aviva-lhe memórias de uma infância e adolescência dividida entre a cozinha e os relvados, bem como dos sabores que uniam estas duas paixões: “Lembro-me de umas sopas de leite com cevada, mel e pão que a minha mãe fazia. Ela não tinha muito tempo para cozinhar porque chegava tarde do restaurante, mas preparava-me sempre essas sopas”. Um prato tão simples, mas tão especial, que lhe aconchegava o estômago à chegada dos treinos de futebol, e que é, provavelmente, a sua memória gastronómica mais antiga.

É também com grande afeição que recorda os almoços em família, “os assados no forno a lenha, os cozidos com chouriça e morcela”, ou aquela época do ano em que a avó preparava uma broa de milho com sardinhas que fazia as delícias do jovem.

Uma estrela para o restaurante do “chef do futuro”

Não é todos os anos que um restaurante com apenas um ano de atividade recebe uma estrela Michelin, mas foi precisamente isso que aconteceu com o Fifty Seconds, em 2019. “Não vou dizer que tivemos sorte porque a sorte dá muito trabalho”, afirma Filipe. O chef assegura que, desde que ganhou a primeira estrela, a equipa do Fifty Seconds começou logo a trabalhar para a segunda. “Não descurar o trabalho é a única forma de mantermos esta distinção”, garante.

Há poucos dias, Filipe voltou a ser surpreendido com um prémio internacional. Desta feita, era a Academia Internacional de Gastronomia que o reconhecia como Chef de L’Avenir (chef do futuro), um galardão especialmente dedicado aos maiores jovens talentos da gastronomia a nível internacional.

Apesar de se tratar de um prémio individual, para Filipe, este é o reconhecimento de um trabalho em equipa. “É o meu nome que aparece no prémio, mas há vinte e cinco pessoas por trás a trabalhar diariamente comigo”, lembra o jovem chef que não esconde o orgulho por arrecadar uma distinção que já foi atribuída a vários cozinheiros que admira e tem como exemplo.

“Conseguir manter a equipa sólida e motivada” é, para Filipe, o maior desafio da sua profissão, ainda para mais tendo em conta o grande desgaste próprio deste ofício. Já lá vão alguns anos desde que Filipe pendurou as chuteiras, mas é provável que a rotina de treinos que lhe preencheu a adolescência ainda lhe seja útil no seu dia-a-dia. No fundo, ser cozinheiro não é assim tão diferente de ser atleta de alta competição. Uma boa preparação física e capacidade de automotivação são fundamentais. “Nós trabalhamos 14 a 16 horas por dia. Por vezes, chegamos às 18 horas diárias. O risco de rutura psicológica por cansaço físico é elevado”, considera Filipe. Vale-lhe a grande paixão que sente pela culinária para aguentar tamanho ritmo de vida.

*Fotos:Gustavo Ramos

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