Por fora, é uma loja igual a tantas outras, mas assim que entramos pela porta dentro a diferença salta à vista. E, dúvidas houvesse, há uma frase impressa numa parede que faz as devidas apresentações: O amor mora aqui. Estamos no número 146 da Avenida Visconde de Salreu, em Estarreja, no espaço do Banqueta Azul – Chalk Paint, projeto de inclusão, criatividade e autoestima através da arte e da estilização de móveis. Salta-nos à vista a nova vida e as novas tonalidades dadas a móveis antigos, muitos deles passados de geração em geração, mas o que nos retém, efetivamente, a atenção é a verdadeira essência daquela casa: dar trabalho a crianças e jovens com necessidades especiais. Jovens como o Vasco, de 21 anos, cujos pais não quiseram que ficasse limitado a passar os dias numa instituição.
Durante alguns meses, na unidade de autismo do município da Murtosa, o Vasco teve a oportunidade de experimentar a arte de pintar móveis. “Depois, veio a pandemia e ficámos todos em casa a trabalhar. O meu filho mais novo estava em aulas e para entreter o Vasco comecei, com ele, a pintar móveis. Foi uma descoberta muito interessante. Às tantas, o meu marido e o meu filho mais novo também começam a pintar connosco”, testemunha Rosário Lacerda, mãe do Vasco, jovem diagnosticado com espectro do autismo. Ultrapassada a pandemia, a família começa a perceber que era preciso começar a pensar na vida ativa do Vasco depois de ele terminar o 12.º ano. “A nossa ideia foi sempre dar-lhe o máximo de autonomia e entretenimento”, vinca Rosário Lacerda, que juntamente com o marido decidiu lançar-se na aventura de abrir um negócio que pudesse ajudar não só o Vasco, como também outros jovens com necessidades especiais. Inicialmente, há quatro anos, instalaram-se na Murtosa, mas, no início deste ano, mudaram-se para Estarreja, para ficarem mais perto de casa – a família reside no município estarrejense.
O modelo de negócio da Banqueta Azul – Chalk Paint é simples. As pessoas que têm móveis antigos em casa podem contactar a empresa e recorrer aos seus serviços de estilização – acredite, aquela arca ou louceiro antigo, herdado da avó, pode ganhar um ar muito mais moderno e atual – e desta forma contribuem para um projeto de inclusão. “Trocamos ideias sobre o que as pessoas têm em mente fazer, damos orçamento e mostramos as nossas tintas, que são de uma marca alemã que quando percebeu o que era o nosso projeto deu-nos a representação da tinta”, explica Rosário Lacerda. Também acontece as pessoas quererem, muitas vezes por falta de espaço, desfazer-se de móveis antigos que têm em casa e entregam-nos à loja, com vista a virem a ser trabalhados e vendidos no espaço comercial que tem um protocolo com a unidade de autismo do Agrupamento de Escolas da Murtosa. “Os miúdos dessa unidade que têm jeito ou gostam de pintar, vêm cá passar uma manhã ou uma tarde a trabalhar connosco”, especifica a responsável pela Banqueta Azul.
E o que representa para estas crianças e jovens passar parte do seu tempo de volta de uma arte como esta? “Divertem-se muito”, refere Marisa Silva, técnica da área social que passou a integrar os quadros da loja em junho deste ano, acompanhando não só os miúdos do agrupamento da Murtosa, como também os outros jovens com necessidades especiais que costumam ir para ali parte dos seus dias. “Temos um miúdo que vem à quarta-feira, outro à quinta. Se têm necessidades especiais e precisam disto, nós acolhemos”, refere Rosário Lacerda.