Em fevereiro de 2021, foi o primeiro a superar a barreira dos 11 metros no lançamento do peso F40 (categoria para atletas de baixa estatura) e, em junho do mesmo ano, na Polónia, tornou-se campeão da Europa. No ano seguinte, ao alcançar a marca de 11,60 metros nos Campeonatos de Portugal de Pista Coberta, em Pombal, superou a melhor marca mundial de sempre que, até aquela altura, pertencia a Denis Gnezdilov – o russo, que compete sob bandeira neutra, detinha o recorde mundial desde os Jogos Paralímpicos de Tóquio 2020, nos quais Miguel Monteiro também estivera presente, conquistando a medalha de bronze. A terceira posição nos mundiais de atletismo paralímpico, em 2023, valeu-lhe um lugar nos Jogos de Paris e, já em maio deste ano, de volta ao Japão, em mais um campeonato do mundo, alcançou a medalha de prata. O lugar mais alto do pódio, contudo, estava reservado para uma ocasião especial.
Na manhã do dia 1 de setembro, Miguel Monteiro conquistou a medalha de ouro na prova de lançamento do peso F40 nos Jogos Paralímpicos de Paris, levando a melhor sobre o mongol Battulga Tsegmid e o iraquiano Garrah Traiash que conquistaram, respetivamente, as medalhas de prata e de bronze, e conseguindo estabelecer novo recorde paralímpico.
Orientado por João Mendes, Miguel Monteiro chegou a Paris2024 na quarta posição do ranking mundial da sua categoria com o melhor registo do ano a 11,17. O foco estava no ouro. “Nos últimos meses, já depois de acabar o curso, foquei-me completamente no atletismo porque era nossa ambição – minha e do meu treinador – chegar a Paris na melhor forma possível de maneira a conseguirmos aspirar algo mais do que o que já tínhamos conquistado”, conta Miguel Monteiro, em entrevista à Aveiro Mag, reconhecendo que, “apesar de não o transmitirmos para fora, o nosso objetivo era a medalha de ouro”.
Naquela manhã, no Stade de France, tudo pareceu correr de feição. “Senti-me bem ao longo de toda a prova, apesar de nem ter começado da melhor forma [o primeiro ensaio resultou nulo]. O segundo ensaio já correu melhor – passei logo a barreira dos 11 metros – e, no terceiro, consegui atingir os 11,21”, descreve o atleta. De acordo com Miguel Monteiro, no lançamento do peso F40, é comum os atletas atingirem marcas muito próximas, pelo que “a qualquer momento alguém podia conseguir melhorar a minha marca”, o que o terá obrigado a permanecer “ativo e atento” até ao final.
“Terminada a prova, quando o último adversário lançou e percebemos que o ouro era nosso, corri para as bancadas para junto do meu treinador, da minha família e amigos, e da comitiva portuguesa. Sinceramente, não me lembro se o meu treinador me disse alguma coisa. Só tenho na memória o abraço caloroso que demos”, recorda. “Quando as palavras não chegam, os gestos falam por nós”.
Cumpre-se, este ano, uma década desde que João Mendes começou a treinar Miguel Monteiro no lançamento do peso. “Comecei por praticar natação, com apenas um ano e meio. Mais tarde, passei para o futsal porque, como toda a gente na escola, gostava de jogar à bola. Mas o senhor João, que já na altura treinava atletas paralímpicos, teve contacto com o atletismo para pessoas com baixa estatura numa competição mundial e, como me conhecia e sabia que eu gostava de desporto, convidou-me para experimentar. Passámos por várias disciplinas – o dardo, o disco, o peso -, mas acabámos por nos concentrar no lançamento do peso por vermos que havia bastante potencial”, relata o atleta da Casa do Povo de Mangualde. Dez anos depois, a relação entre atleta e treinador é “muito boa”. “Ele é quase como um segundo pai para mim. Nos treinos, além do ato de execução do lançamento propriamente dito, damos por nós muitas vezes a conversar sobre os problemas de cada um, as nossas famílias e o futebol – somo de clubes distintos. É muito bom treinar com ele”, assegura.
Com apenas 23 anos, Miguel Monteiro tem um palmarés recheado de recordes e conquistas, todavia, a medalha de ouro alcançada em Paris vem ocupar um lugar especial. “Foi a [conquista] mais marcante. Felizmente, as coisas têm corrido bem, mas ainda não tínhamos chegado tão longe como sabíamos que éramos capazes”, afirma o atleta, reconhecendo que “os Jogos são o palco onde todos os atletas querem brilhar”. “É uma competição fantástica! São também uma pressão acrescida e uma grande responsabilidade, daí querermos sempre chegar aos Jogos nas melhores condições possíveis”, realça.
Na opinião de Miguel Monteiro, desde o ciclo 2017-2021, o desporto paralímpico em Portugal “evoluiu muito”. A equiparação de apoios e bolsas entre atletas olímpicos e paralímpicos veio mudar o paradigma, no entanto, continua a ser “preciso trabalhar na captação de talento”. “As seleções estão a ficar cada vez mais envelhecidas e isso não é bom para o desenvolvimento das modalidades”, entende o atleta, confiante que “estes Jogos Paralímpicos de Paris 2024 possam ajudar a cativar novos atletas”.
O que vem a seguir? Miguel Monteiro não esconde querer alcançar ainda “mais e melhores” resultados no atletismo paralímpico – a presença nos Jogos de Los Angeles2028 é uma meta traçada. Para o português, “há sempre espaço para melhorarmos, mesmo que estejamos muito próximos do topo. Quero continuar a lançar, se possível, mais longe do que já fiz”. Por ora, há que “desfrutar o momento, recuperar energias e procurar orientar a vida profissional”.