“Lembro-me bem do exato momento em que a música clicou comigo pela primeira vez”, assegura Bruno Silva, músico fundador dos Fort Benny, nova banda aveirense de rock alternativo, em entrevista à Aveiro Mag. “Dois vizinhos meus que eram irmãos foram lá a casa para me mostrar uma música nova, a Chop Suey!, dos System Of A Down [lançada em agosto de 2001, foi o primeiro single de “Toxicity”, o segundo álbum da banda norte-americana]. A música tem uma entrada célebre, que vai evoluindo com a introdução progressiva dos instrumentos até ao momento em que explode. Foi nesse momento de explosão que algo em mim despertou”, atesta o aveirense. Bruno não sabe se explicar se foram as palavras de Serj Tankian, a inconfundível performance musical ou, simplesmente, graças ao headbang que os seus vizinhos executaram com uma coordenação irrepreensível. “O que é certo é que aquele momento nunca mais me saiu da cabeça”, afirma.
A partir daí, a música passou a fazer parte do seu imaginário, habitou-lhe os pensamentos e dominou-lhe as brincadeiras. “Na escola, fazia de conta que ia dar um concerto e agrupava a minha turma toda no recreio para assistir. O concerto, depois, não passava de um amigo meu a tocar percussão num caixote do lixo e eu a cantar por cima, imitando o som de uma guitarra”, descreve o jovem multi-instrumentista. Recordando outra brincadeira, Bruno fala do hábito pesquisar as setlists das suas bandas de eleição, de agrupar as músicas pela mesma ordem e de se imaginar em pleno concerto. Nessas recriações nada era deixado ao acaso: “Os microfones eram vassouras e as almofadas, que tomavam o lugar de colunas de som, estavam estrategicamente posicionadas em «palco»”, detalha Bruno, reconhecendo que, hoje, de cada vez que pisa um “palco a sério”, ainda voltam as recordações desses “concertos a fingir”.
Aconselhado pelo pai, chegou a ter aulas particulares de bateria com Pedro Menano, baterista dos The Paperboats e amigo da família, durante alguns anos, mas Bruno nunca foi “um aluno muito disciplinado”. “Não treinava”, confessa, esclarecendo que não lhe agrada a ideia de ter aulas de música. “Tudo o que seja praticar escalas ou ensaiar músicas soa-me a trabalho e eu prefiro encarar a música como expressão. Gosto de desenvolver a minha técnica de forma mais autodidata e experimental, não tanto por repetição, mas pela descoberta de coisas novas”, entende o músico, admitindo, porém, não ser “um bom exemplo”.
Bruno tem “um método de escrita e composição bastante rápido”, levado a cabo através de um processo de “daydreaming" [sonhar acordado] em que a música lhe surge naturalmente e as palavras vêm logo atrás. Uma aptidão assinalável, mas nem sempre bem compreendida. Há cerca de três anos, Bruno viu a sua banda anterior desfeita devido a “conflitos de ego” e ao confronto entre “diferentes capacidades de produção”. Um término hostil que lhe deixou nas mãos um conjunto de músicas que nunca tinham sido gravadas. Umas já eram composições consolidadas, outras não passavam de ideias soltas. Foram, todavia, estes temas esquecidos que deram origem àquele que viria a ser o primeiro álbum de originais da sua nova banda. Editado em novembro de 2023, “Not Crazy Enough” foi “quase todo” gravado no íntimo do quarto de Bruno, de forma independente e enquanto o jovem aveirense trabalhava como operador de call-center ou web developer.
“Em vez de desmotivar [com fim do anterior projeto] e de pensar que comigo uma banda nunca ia funcionar, decidi seguir o exemplo do Dave Grohl [Dave Grohl foi baterista dos Nirvana. Com a morte de Kurt Cobain, em 1994, a banda termina, mas Dave Grohl não desiste do sonho da música. No ano seguinte, larga as baquetas, torna-se guitarrista e vocalista e funda os Foo Fighters, conjunto no qual, ainda hoje, se mantém”. “Ele pegou no que já tinha, avançou e só depois encontrou os companheiros. Também eu comecei por gravar as músicas que já tinha e só mais tarde, quando quis tocá-las ao vivo, é que comecei à procura de uma banda”.
Se, contrariamente a Grohl, Bruno Silva podia ter avançado sozinho? Podia, claro. E, certamente, com a má experiência que vivera na sua banda anterior e com todo aquele material original já composto e pronto a ser gravado, é bem provável que essa hipótese não tenha estado assim tão longe de se concretizar. No entanto, Bruno é daqueles músicos que valorizam a experiência partilhada, a força da união de um grupo. “Atuar a solo nunca foi algo que eu quisesse. Mesmo que seja eu a compor as músicas, gosto da ideia de camaradagem, de equipa. Não gosto do conceito «Bruno Silva e seus colaboradores». Tudo o que fiz na música sozinho, fi-lo por necessidade e não porque tenha esse interesse”, esclarece o músico. Talvez como forma de homenagear as bandas da sua vida – Os Beatles, os Pink Floyd, os Radiohead – ou de cumprir os sonhos daquele miúdo que decorava as setlists dos seus artistas favoritos e convocava os colegas de escola para concertos de brincar, Bruno insiste em formar uma banda. Juntam-se-lhe, então, Rui Machado (guitarra), João Rosa (baixo) e, mais recentemente, Pedro Seabra (teclados e segunda voz) e criam-se os Fort Benny.
Entusiasmada quanto ao futuro, a banda aveirense - que, por estes dias, tem andado a gravar o videoclipe para o tema “Forever in Solitude” – está focada em admitir novo membro, quebrando, finalmente, aquilo a que Bruno já chama de “clássica maldição dos bateristas”. O objetivo seguinte passa por voltarem à estrada com “Not Crazy Enough” e por terminarem um segundo álbum. Entretanto, diz Bruno Silva, o importante é manterem-se ativos – “Vamos tentar criar conteúdos para as redes sociais, versões acústicas das músicas, entrar em concursos, apostar em projetos de colaboração, etc.”, sempre atentos ao feedback daqueles – e o número vai aumentando de dia para dia – gostam e seguem os Fort Benny.