A Red Cloud Teatro de Marionetas está de parabéns! Fundada em 2013, a companhia – hoje sediada em Aveiro - comemora 10 anos de atividade profundamente marcada pelo espírito inovador e a devoção inesgotável dos seus fundadores e diretores artísticos: Rui Rodrigues e Sara Henriques.
Rui é natural de Coimbra, Sara cresceu em Espinho; ele vem do domínio das artes plásticas e visuais – frequentou o curso de Pintura na Faculdade de Belas Artes do Porto – e ela do mundo das artes de palco – deu os primeiros passos no Teatro Popular de Espinho, mais tarde, foi estudar para o Balleteatro do Porto e, alguns anos depois, concluiu o mestrado em Teatro pela Universidade de Évora. Dois percursos diferentes, mas complementares, que viriam a cruzar-se, há quase 20 anos, por coincidência, na companhia de Teatro de Marionetas do Porto, fundada – e, à data, dirigida – por João Paulo Seara Cardoso.
Escritor, investigador, encenador e bonecreiro, Seara Cardoso foi “uma pessoa extremamente importante na história do teatro com marionetas em Portugal”, atesta Sara Henriques. “ revolucionou a disciplina, implementou uma série de paradigmas e estéticas que nunca antes tinham sido trabalhadas com marionetas”. Seara Cardoso era também professor e lecionava a disciplina de Interpretação Teatral no Balleteatro do Porto. Foi nesse contexto que conheceu Sara. “Era a cadeira que eu mais gostava. Aliás, acho que era a cadeira favorita de toda a gente!”, arrisca a atriz e encenadora, recordando o momento em que, ao concluir os seus estudos, Seara Cardoso a convidou para entrar no universo das marionetas.
Quando Sara entra para o Teatro de Marionetas do Porto, já Rui Rodrigues fazia parte da companhia. “No terceiro ano do curso de Pintura pus-me a fazer contas de cabeça... Ser o próximo grande artista contemporâneo não me parecia um bom plano e ser professor – a saída óbvia para quem completa aquele curso – também não era vida que me atraísse”, relata, explicando o porquê de se ter atirado à lista telefónica, ter procurado por companhias de teatro na cidade e se ter oferecido, mesmo sem currículo, para trabalhar na conceção plástica de cenários, adereços e outros objetos de cena. Resultado? Depois de alguns meses na companhia Pé de Vento, acabaria por integrar a companhia de Teatro de Marionetas do Porto onde passaria os 12 anos seguintes. “Entrei numa altura em que estavam a construir um espetáculo – o Macbeth, de Shakespeare – com mais de 35 marionetas”. “Foi a minha recruta”, descreve, reconhecendo “a sorte” de chegar a uma companhia que, apesar de já contar com vários anos de trabalho, estava num momento de exploração e reinvenção e, além disso, “contava com a experiência do João Paulo que sabia tudo o que havia para saber sobre o universo das marionetas”.
Rui, tal como Sara, nunca tinha tido grande contacto com marionetas. “Desde o início que é isso que mais me interessa e cativa: a construção da ilusão, seja no teatro ou no cinema”, sublinha Rui. “Foi isso que me levou a querer trabalhar nos bastidores de um teatro. Sempre tive um fascínio especial pelos making-of dos filmes, principalmente, os filmes mais fantásticos, que envolviam sempre muito trabalho de efeitos especiais”. “O Alien, o Oitavo Passageiro (1979), do Ridley Scott, por exemplo, é feito com marionetas, mas depois tem um efeito incrível na tela”, refere, como exemplo.
Por falar em cinema, importa referir que, no mesmo ano em que fundaram a Red Cloud Teatro de Marionetas, além de terem sido convidados para assumirem a construção e manipulação em cena das marionetas do espetáculo “El Gato con Botas”, na emblemática Roya Opera House, em Londres, Rui e Sara foram também dois dos responsáveis pela criação da “baleia” que figura no filme As 1001 Noites, de Miguel Gomes. A cena icónica foi gravada na praia da Barra, em Ílhavo, e, antes de vir a público que aquele aparato se destinava a uma produção cinematográfica, muita gente acreditou que o elemento cénico era, na verdade, a carcaça de uma baleia verdadeira que tinha dado à costa. “Lembro-me que, no dia das filmagens, o pessoal da produção teve de segurar alguns curiosos que queria entrar à força no areal. Diziam que a baleia também era deles. Tivemos de lhes explicar que a baleia, na realidade, era um adereço, uma réplica em esferovite”, lembra Rui, entre gargalhadas.
Mas voltemos ao teatro e ao nascimento da Red Cloud. João Paulo Seara Cardoso viria a falecer em 2010 e, com o desaparecimento do mestre, “naturalmente, as coisas começaram a ficar diferentes” na companhia portuense, reconhece Rui. “Sentimos necessidade de mudar, de trabalhar noutro local. E porque não inventar esse local? Arriscámos”. Em 2013, ao fim de mais de uma década no Teatro de Marionetas do Porto, a dupla abandona a cidade invicta e funda o projeto Red Cloud Teatro de Marionetas. Com o apoio do Coletivo HUSMA, nas pessoas de Pedro Cardoso, João Apolinário e Nuno Cortez, a 10 de junho daquele mesmo ano, apresentam o primeiro espetáculo com a chancela da Red Cloud no 6.º Encontro Internacional de Marionetas de Montemor-o-Novo. ‘PLIP’ voltaria a palco em abril deste ano, desta vez, no “micro teatro” do Espaço Red Cloud Marionetas, no número 52A da rua Hintze Ribeiro, em Aveiro, como forma de comemorar a primeira década de atividade da companhia.
O próximo espetáculo da Red Cloud Teatro de Marionetas, que tem estreia marcada para os dias 1, 2 e 3 de dezembro no auditório do Teatro Aveirense, tem por base a história de ‘Hansel e Gretel’ do conto tradicional dos irmãos Grimm. “O espetáculo parte do conto seu homónimo, em que é considerada a sua dimensão intemporal e tão familiar, permitindo tecer diversas ligações com a atualidade e reelaborando o próprio percurso de Gretel e Hansel, sob uma perspetiva de questionamento relativo ao significado de “Bruxa” na esfera do fantástico e da história social e humana”, pode ler-se no site da Red Cloud.