Na presidência da Comissão Vitivinícola da Bairrada desde 2012, Pedro Soares falou à Aveiro Mag sobre os principais desafios que os vinhos da região enfrentam na atualidade. Com o aumento do reconhecimento dos néctares da Bairrada, acompanhado de um crescimento do enoturismo, é preciso, cada vez mais, separar o trigo do joio. Como? Aumentando a fiscalização, refere, numa conversa decorrida poucos dias depois de terem sido conhecidos os Melhores Vinhos e Espumantes Bairrada de 2024.
Tem havido um crescimento no reconhecimento dos vinhos da Bairrada?
A região da Bairrada não é uma região mainstream. Tem as suas particularidades, tem um foco muito grande na produção de espumante e acaba por produzir vinhos diferenciados. O que acontece é que o consumidor português tem vindo, ele próprio, a estar mais capacitado e com mais formação e tem vindo a escolher muitas vezes algo que lhe faça a diferença. Ou seja, temos vinhos que são muito semelhantes e depois temos vinhos como os da Bairrada e do Dão que são facilmente identificáveis. E isso tem um valor acrescido. E tem um valor também para os turistas. Um sommelier mais depressa acaba por ganhar a atenção de um turista se lhe apresentar uma proposta diferenciada. E acho que aí nós temos marcado pontos ao longo dos anos e isso é importante.
Tem sido importante também o trabalho que os produtores têm feito no mundo, mais até que a comissão, na comunicação e diferenciação da região. E também o facto de termos a nossa gastronomia, onde o leitão acaba por ser o ponto de referência, mas temos a felicidade de estar numa região diversa, com a ria de Aveiro, o arroz do Mondego e do Vouga, e conseguimos tirar partido dessa junção entre a gastronomia, o vinho e o turismo.
O enoturismo tem vindo a crescer muito nos últimos anos?
Sim. O enoturismo tem vindo a crescer. Na região não é a comissão que gere o enoturismo. A região da Bairrada assumiu, em 2006, uma posição vanguardista. Criou uma associação específica para liderar e promover o enoturismo. Uma associação que integra outros produtores que não apenas os produtores de vinhos. Os restaurantes, a hotelaria, os municípios, alguns operadores. E, portanto, acabamos por ter aqui uma associação que pensa enoturismo, que tem um espaço aberto sete dias por semana, que tem mais um espaço numa localização aproximada aberto cinco dias por semana. Há aqui este caminho que foi feito desde 2006 e que, hoje em dia, nos permite dizer com garantia que, sim, o enoturismo tem crescido muito. E os países de origem daqueles que nos visitam têm-se diversificado e temos conseguido aumentar a proveniência de países mais interessantes do que aqueles que até há muito pouco tempo nos visitavam. Há um crescimento muito grande do cliente do Brasil, do cliente dos EUA, que é um cliente muito importante para a nossa região.
Estão com quantos produtores neste momento?
Produtores a certificar na Bairrada são cerca de 120, como associados da rota temos 100.
Houve crescimento?
Na certificação, não. O que há é um crescimento de produtores de uma dimensão média e que nos ajudam a ter mais embaixadores dentro da região.
Estamos a falar de uma produção anual de quantas garrafas?
Certificamos de cerca de 7,5 milhões de garrafas por ano.
Há perspetiva para crescer?
Há. Vamos seguramente fechar o ano a crescer. Pelos dados que temos, 8 por cento.
Este ano foi uma boa colheita?
Foi uma boa colheita do ponto de vista qualitativo, mas inferior em termos de quantidade. Tivemos cerca de 25 por cento de quantidade a menos, mas em termos qualitativos estamos muito satisfeitos.
Isso até pode ser bom na chegada ao mercado...
Exatamente. Na altura em que estamos, com excesso de produção um bocadinho por todo o lado, podemos encarar isso como sendo bom.
Tem havido um refrear do consumo?
Existe. Mas acho que isso se nota mais nos vinhos de entrada de gama e de preço mais baixo. Quando há estas crises, quem sente mais são aqueles que têm menos recursos.
E acho que o facto de termos no espumante uma bebida muito importante para a região joga a nosso favor, uma vez que é dos tipos de bebida que tem vindo a crescer, por todo o mundo, o seu consumo. Também o facto de o consumidor estar mais interessado em vinhos brancos e rosés, que é algo que nós fazemos com qualidade ao longo dos anos. Nos tintos sente-se uma dificuldade maior, mas como nós não somos produtores de muitos litros de vinho tinto, ao contrário de outras regiões do país, acabamos por sentir um bocadinho menos esse impacto. Há realmente essa situação, estamos apreensivos, não estamos a olhar para o futuro com a confiança que estávamos em 2018 ou 2019, antes da pandemia, mas acreditamos que estamos ligeiramente mais protegidos do que outras regiões tendo no nosso mindset muito a questão da produção de espumantes.