Quando chegámos à Grestel, o forno ainda estava quente. “Acabámos de o abrir”, anuncia Carlos Pinto. Mais de 260 peças cerâmicas de tableware repousavam, empilhadas por vários tabuleiros, expostas ao olhar atento do diretor fabril e da sua equipa. Tinham acabado de ser sujeitas a um teste pioneiro na indústria cerâmica nacional - no final do mês de julho, o CTCV – Centro Tecnológico de Cerâmica e do Vidro -, em Coimbra, já tinha levado a cabo um “pequeno teste à escala laboratorial (270 litros)” de cozedura de produtos cerâmicos com mistura de gás natural e até 50% de hidrogénio. No entanto, o ensaio que ocorreu esta manhã na Grestel foi o primeiro teste do género realizado à escala industrial a ter lugar não só em Portugal, mas em toda a Europa. “Os italianos já tinham experimentado fazer isto na área dos pavimentos e revestimentos, mas, no que diz respeito ao tableware [utensílios de mesa], somos os primeiros”, assegura Carlos Pinto.
Este ensaio surge na sequência de uma parceria entre a Grestel, o HyLAB – um laboratório colaborativo para a investigação do hidrogénio verde, que resulta de um consórcio composto por algumas das maiores empresas energéticas do país (EDP, Galp e REN, por exemplo) –, a tecnológica Fusion Fuel – será a primeira empresa a produzir hidrogénio verde em Portugal – e a Induzir – construtora de fornos industriais e responsável pela adaptação do forno onde este ensaio ocorreu.
“A verdade é que não fazíamos a mínima ideia de como as peças iam sair”, admite o diretor fabril. À primeira vista, todavia, a avaliação parecia ser muito positiva. “A tonalidade das peças saiu ligeiramente diferente – os verdes, por exemplo, ficaram mais escuros do que o nosso padrão – e os vidrados brilhantes parecem ligeiramente amarelados”, avalia Carlos Pinto, sem deixar de se mostrar “confiante” de que, depois de afinar o procedimento, esses pormenores possam ser resolvidos.
Todo o processo de cozedura foi cuidadosamente monitorizado, nomeadamente, no que concerne aos gases emitidos para a atmosfera. “O consumo foi mais baixo do que estávamos à espera - o poder calorífico do hidrogénio permite reduzir o volume consumido – e ainda conseguimos reduzir significativamente o CO2(dióxido de carbono)”, congratula-se a equipa responsável. “Receávamos que os NOx (óxidos de azoto) pudessem aumentar, mas isso não aconteceu”, acrescentam.
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Por se tratar de um primeiro ensaio de cozedura com mistura de hidrogénio e gás natural, a opção passou por levar ao forno “uma grande variedade de peças”: “Fizemos questão de ter peças de diferentes tamanhos e formatos, vidradas e não vidradas, com cores representativas de todo o espetro que usamos, produzidas com recurso a diferentes tecnologias de produção – por enchimento, sob pressão, por prensagem e por contramoldagem – e de três tipos de pasta diferentes – pasta branca normal, pasta preta Ecogres e pasta amarela Ecogres (com resíduos de ferro de outras indústrias)”, enumera o diretor fabril.
Nas próximas semanas, esta equipa vai realizar novos ensaios com variações sistemáticas na proporção entre o hidrogénio e o gás natural utilizado. Os resultados obtidos serão, depois, analisados comparativamente, avaliando as diferentes cores e tonalidades, de forma a identificar as reações ocorridas e perceber quais as alterações a pôr em prática para obter os resultados pretendidos.
Mais tarde ou mais cedo, a indústria cerâmica vai ter de completar a sua transição energética e a Grestel quer estar na dianteira. “A sustentabilidade faz parte do ADN da Grestel”, atesta Carlos Pinto, não escondendo a ambição de ajudar a torná-la na “fábrica mais sustentável do mundo”. Recorde-se que a Grestel, através do projeto Ecogres, é uma das finalistas do Prémio Regiostars 2024, uma distinção da União Europeia para projetos inovadores que contribuam para o desenvolvimento regional.