Vieste para Portugal porquê?
Portugal é fácil, Portugal é muito bom. Agora tenho emprego, numa empresa. Sou carpinteiro. O meu patrão é bom, ele gosta de mim, e eu gosto dele.
Como chegaste a Portugal?
Vim de autocarro.
Quando chegaste a Portugal, foste para onde?
Primeiro fui para Beja.
Como foste parar a Beja?
Tinha um amigo lá, que me disse que havia emprego na agricultura.
Ficaste lá muito tempo?
Quatro meses.
O que fazias?
Na apanha da maçã, da azeitona… Era difícil. Não era bom.
E onde moravas nessa altura?
Era uma caixa. Um contentor. Com muitos trabalhadores lá dentro, em beliches.
E quanto dinheiro ganhavas?
Por mês 400 euros, 300 euros… Não era bom.
Os trabalhadores eram de que países?
Eram sobretudo paquistaneses. Era um homem do Paquistão que decidia se eu tinha trabalho em cada dia. Às vezes dizia que não havia trabalho para mim. E não tinha contrato.
Estavas legal em Portugal?
Da primeira vez que vim, Segurança Social, Finanças, tudo estava ok.
Foram tempos difíceis?
Foram. Mas agora estou feliz.
Depois de Beja foste para onde?
Vim para Pardilhó. Em Novembro do ano passado.
Porquê Pardilhó?
Tinha um amigo que me disse para vir, porque talvez encontrasse trabalho numa empresa. Eu vim mas não fui chamado. Tentei outras empresas e uma vez uma ligou a dizer que eu tinha trabalho.
A fazer o quê?
Carpinteiro. Uma empresa de móveis, na Murtosa. E também produz colmeias.
Gostas do teu trabalho?
Gosto. Agora estou feliz.
Onde moras agora?
Agora tenho uma casa. Primeiro encontrei um pequeno quarto em Pardilhó, onde moravam três pessoas. Depois encontrei uma casa.
Como ias trabalhar para a Murtosa?
Primeiro ia a pé, depois o meu amigo deu-me uma bicicleta. E agora vou de bicicleta.
Dizes que agora estás feliz. Mas a tua família está longe.
Está longe. Sem a família não estou feliz. Mas tenho emprego e dinheiro, e isso é bom. Consigo mandar dinheiro para a família.
Queres que a tua família venha para Portugal?
Sim, quero trazê-los para cá. Estou a tentar.
E eles querem vir?
Querem. Os meus filhos dizem “pai, leva-nos para Portugal depressa”. Eu estou a tentar trazê-los todos. Todos os dias a minha mulher chora. Não nos vemos há dois anos. É difícil.
Não pensas em voltar ao Bangladesh?
Não. Não quero voltar. Não gosto do meu país agora. Há demasiados problemas, politicamente. Quero ficar em Portugal e um dia talvez tenha uma loja minha.
Alguma vez te sentiste discriminado em Portugal? Foste vítima de racismo?
Não, nunca tive nenhum problema.
É difícil falar português?
Muito difícil. Percebo algumas coisas e sei dizer “olá”, “bom dia”… Mas é muito difícil.
E gostas da comida portuguesa?
Gosto de peixe. E gosto de cozinhar. Em Itália trabalhei num restaurante e gostava de voltar a trabalhar.
És um homem religioso?
Sou. Sou muçulmano. Rezo todos os dias cinco vezes.
O que fazes quando não estás a trabalhar?
Tenho uma família que é minha amiga e que me ajuda. Todos os dias ligo ao meu amigo.
É bom ter amigos que nos ajudam…
É como um pai. Toda a família... É um bom amigo. É um bom amigo.
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