Em 1987, a epidemia de HIV/SIDA continuava a ceifar vidas e a aterrorizar o mundo. Sem tratamento disponível e com o desafio dos tabus e preconceitos associados aos doentes, as medidas de saúde pública preventivas eficazes necessitavam de lideranças políticas bem informadas. Naquele ano, o médico Anthony Fauci preparava-se para informar a Casa Branca sobre o ponto de situação no terreno e na investigação, quando ouviu um dos conselhos mais marcantes de um colega: “Se baseares as tuas sugestões na verdade e no conhecimento científico, mais cedo ou mais tarde vais dizer algo ao Presidente ou Vice-presidente que ele não quer ouvir. Algumas pessoas nunca querem desapontar uma figura poderosa. Não caias nessa armadilha.”
Essa ética, simples mas desafiante, marcou profundamente a carreira do Dr. Fauci, que aconselhou várias administrações republicanas e democratas.
Nascido a 24 de Dezembro de 1940 em Brooklyn, filho de um farmacêutico, o jovem Fauci cedo manifestou interesse pela ciência e pelo conhecimento.
Depois de completar a sua educação no Regis High School e no College of the Holy Cross, sob a orientação jesuíta, Fauci seguiu para a sua formação médica na Cornell University Medical College, onde se destacou academicamente e começou a moldar o seu futuro como um influente investigador e líder em saúde pública. Em 1968, juntou-se ao National Institutes of Health, iniciando uma carreira de décadas que o levaria a tornar-se diretor do National Institute of Allergy and Infectious Diseases (NIAID).
Fauci foi um dos principais editores do célebre livro de Medicina Interna "Harrison´s Principles of Internal Medicine", cuja primeira edição foi publicada em 1986, e continuou nas edições seguintes, até a mais recente, a 21ª, publicada em 2022.
Anthony Fauci ficou profundamente marcado pela epidemia de SIDA e pela sua crueldade, que devastou amigos, colegas, comunidades e famílias. Cedo percebeu a necessidade de investir na investigação básica e multidisciplinar para atingir uma vacina para a SIDA.
Essa solução nunca chegou, mas a estrutura montada daria frutos décadas volvidas na resposta à epidemia de COVID 19, através do desenvolvimento da vacina para o vírus SARS-CoV-2.
O seu percurso de vida está amplamente registado na sua recente biografia “On Call” (ainda sem tradução para português) e no documentário “Fauci", um trabalho premiado que regista a sua vida e carreira lançado pela Magnolia Pictures em setembro de 2021.
O médico e investigador é um exemplo de credibilidade e dedicação ao serviço público, digno de constar nos manuais dos estudantes de Medicina. A sua coragem e fidelidade à verdade, mesmo quando esta implica incerteza, marcou a sua interação recente com Trump e os seus acólitos.
Em novembro de 2021, a Skyhorse lançou um livro do político ativista anti-vacinas Robert F. Kennedy Jr. intitulado "O Verdadeiro Anthony Fauci: Bill Gates, Big Pharma e a Guerra Global contra a Democracia e a Saúde Pública". Em resposta, Fauci descreveu o autor como "um indivíduo muito perturbado". Cedo ficou na mira de muitos republicanos que ameaçaram a sua vida e a dos seus familiares.
O imunologista octogenário é, portanto, um exemplo claro de como ser independente é arriscado, mas essencial para salvar vidas, mesmo quando isso significa enfrentar pensamentos mágicos, ignorância arrogante e teorias da conspiração.
Ao longo de sua carreira, Fauci recebeu inúmeros prémios e distinções, incluindo a Medalha Presidencial da Liberdade, o Prémio de Excelência em Pesquisa do National Institutes of Health e a classificação como uma das 100 pessoas mais influentes do mundo, pela revista TIME, em várias ocasiões.
O seu trabalho e dedicação fazem dele não só uma figura central na luta contra as doenças infecciosas, mas também um defensor da saúde pública em todo o mundo.