A Associação Quinta das Relvas foi fundada em 2016 na Branca, no concelho de Albergaria-a-Velha, mas é preciso andar muito para trás para contar a história completa. A quinta onde esta Organização Não Governamental (ONG) funciona foi construída no século XVIII, em 1789, como está escrito no topo da sua fonte.
A história da propriedade está envolta num certo mistério, mas relatos escritos revelam alguns dos seus principais capítulos: foi construída por uma família rica local, foi perdida através do jogo, pertenceu à igreja e foi a primeira escola primária da aldeia. Depois, já no século XX, foi comprada pela família de Dias Marques pelas suas terras: cheias de barro, um material necessário para a fábrica de tijolos e telhas da família. Desde então, pertence à mesma família, embora Dalila e Fernando tenham sido os primeiros a viver realmente na quinta, restaurando lentamente o edifício principal com as suas próprias mãos e plantando as florestas da herdade com espécies autóctones, “em vez da tendência local regular para a monocultura de eucalipto”.
Já em pleno século XXI a história ganha novos protagonistas: Beatriz, filha de Dalila e Fernando, e António, seu companheiro. Foi este casal que, saído do bulício da capital, encontrou na Branca o refúgio ideal para um projeto vocacionado para as artes e a sustentabilidade.
“Trabalhávamos em Lisboa fora das nossas áreas de interesse”, explica Beatriz Manteigas, de 34 anos, que na Quinta das Relvas é a coordenadora do departamento de artes e responsável pela “papelada chata”. Ambos com formação e interesse em Artes Visuais, começaram a olhar para a propriedade albergariense, que era usada apenas como casa de férias, como uma oportunidade para desenvolverem um projeto relacionado com as suas próprias paixões. “Começou a surgir a ideia de usar a quinta, mas não queríamos fazer casamentos e batizados”, ri-se Beatriz.
A ideia era criar um projeto assente nos princípios da permacultura, um conceito concebido pelos australianos Bill Mollison e David Holmgren durante a década de 1970 desenvolvido em torno de práticas ecológicas, agrícolas e comunitárias e que tem na sustentabilidade o seu principal propósito.

A permacultura, descreve Beatriz, “é uma abordagem holística para o planeamento e gestão de povoamentos humanos a partir da observação da natureza, seguindo um conjunto de princípios em prol da criação de sistemas baseados nas possibilidades de interconexão dos diferentes elementos que constituem esse plano. Esse planeamento pode considerar várias áreas, desde a agricultura regenerativa, o planeamento urbano, o rewilding e a resiliência comunitária”.
A mudança de Lisboa, onde se conheceram, para uma povoação pequena e rural teve desde logo efeitos pessoais. “Não é que estivéssemos cansados da vida na cidade, mas achámos que conseguíamos fazer mais noutro contexto. Era um sufoco perceber que o nosso tempo e energia nunca eram usados na plenitude”, diz Beatriz. “Na Branca podemos aplicar mais o que temos para dar. Foi libertador”.
Rumaram à Branca “quase com 500 euros no bolso”, recorda. Uma das prioridades foi, por isso, encontrar fontes de financiamento para as atividades que tinham planeadas. O programa Erasmus+ foi uma das soluções, ajudando a pôr em marcha projetos já com alguma dimensão, como o FOUNDATIONS e o SEEDS.
Entre outros, um trabalho igualmente já desenvolvido foi “Admirável”, em 2024, uma exposição exibida na Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados (UCSP) da Branca em parceria com a Câmara de Albergaria-a-Velha, no âmbito do CURARTE – Arte e Saúde em Espaço Público, apresentando obras de vários artistas na sequência de residências artísticas na Branca e com curadoria de Beatriz Manteigas. CURARTE é um projeto em artes visuais com programação regular pensada para a UCSP da Branca, visando fomentar o acesso da comunidade local a esta área artística de forma acessível, inclusiva e participativa.