O Teatro Aveirense recebe, nos dias 30 e 31 de maio, a mais recente encenação de Hamlet, uma das mais emblemáticas peças de William Shakespeare, pelas mãos de Nuno Cardoso, ex-diretor artístico do Teatro Nacional São João, no Porto. Depois de uma temporada em exibição – teve lotação esgotada nas primeiras quatro semanas –, a peça está agora em digressão nacional.
Mais do que uma revisitação de um clássico, esta proposta de Hamlet pretende ser uma reflexão sobre o teatro, a humanidade e o tempo presente. “O Hamlet é um projeto que sempre quis fazer, mas fui adiando até sentir que tinha a maturidade necessária para o abordar como desejava”, explica o Nuno Cardoso, em entrevista à Aveiro Mag.
Ao longo do seu percurso, Nuno Cardoso assistiu a várias versões da tragédia shakespeariana – desde encenações tradicionais até propostas mais experimentais, como a versão sul-americana com um elenco de atores com trissomia 21. A leitura que propõe é fiel à universalidade de Shakespeare, mas não reverente no sentido académico ou decorativo. “Critico a ideia de se fazer uma peça de Shakespeare só para que certas pessoas reconheçam citações e se sintam culturalmente válidas. Isso é um erro”, reitera. Para Nuno Cardoso, o dramaturgo inglês é “um autor permanentemente contemporâneo” e “o mais importante é a forma como o lemos à luz dos problemas de hoje”.
Para o encenador, fazer teatro é estabelecer uma ponte com o público, recusando a ideia de que este deve carregar a responsabilidade de compreender as obras. “Sem público, não há teatro. O nosso trabalho é tratar os textos e as situações dramáticas de forma que o público possa interagir com eles. Isto não significa ser facilitista, significa trabalhar mais”, defende. É nesse sentido que vê o público como “o último ator de um espetáculo”.
A encenação de Hamlet surgiu também como uma espécie de gesto de despedida do TNSJ, instituição que Nuno Cardoso dirigiu entre 2019 e 2024. “Quis que o meu último gesto no São João fosse um grande fôlego. Algo que tocasse o público. E Hamlet pareceu-me o texto certo para isso”, refere.
Entre o humor subtil que permeia a peça, mesmo nos seus momentos mais trágicos - “Quase todas as obras do Shakespeare estão atravessadas por um humor muito inteligente e Hamlet não é exceção. Tem momentos absolutamente deliciosos. Não sei quem disse isto, mas alguém definiu o humor como ‘o estado final da inteligência’. Se há coisa que um texto do Shakespeare é, é inteligente. Portanto, é natural que esteja repleto de humor” - e a colaboração com “atores com quem já trabalhar há décadas e quem deve muito”, Nuno Cardoso descreve o processo como “uma aventura coletiva” marcada por uma “feliz colaboração”. “O resultado, goste-se ou não, reflete isso: um trabalho de conjunto de todos nós”.
Aveiro não é um destino novo para Nuno Cardoso, que aqui apresentou diversas produções durante os seus mandatos no TNSJ. “É uma cidade universitária, cheia de autenticidade, com um estilo de vida próprio. E o teatro represente, de alguma forma, um fórum para a cidade. Temos tido sempre uma extraordinária adesão em Aveiro, e acredito que, depois da Capital Portuguesa da Cultura, o teatro esteja ainda mais vivo”, diz, destacando o papel fundamental dos teatros fora dos grandes centros urbanos no panorama cultural nacional.
Quanto ao lugar que esta encenação ocupará no seu percurso, prefere a cautela. “É uma boa pergunta, mas ainda é prematuro. Em relação à temporada do Porto, acho que foi uma boa forma de dizer adeus e tocar um público imenso. Agora, o que representa para mim, acho que ainda estou demasiado próximo para conseguir avaliar”.
Os bilhetes para as apresentações no Teatro Aveirense estão disponíveis na bilheteira do teatro e nas plataformas online.