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Imagine um mundo sem restaurantes

Opinião

Tiago Castro*

Nota introdutória: Esta crónica era para ser outra coisa, era para ser sobre um restaurante. Mas é impossível não escrever sobre o que se está a passar na restauração e ignorar o sofrimento que todo o setor está a sentir.

Li em tempos que cozinhar é um ato de amor e que é essa a razão que justifica o facto da maioria dos cozinheiros profissionais serem homens. Para uma mulher cozinhar é amar. O seu filho, o seu marido, os seus. E não se profissionaliza nem se orçamenta um ato de amor.

É uma ideia bonita sem dúvida, mas para mim existe uma grande fatia de restaurantes que são um ato de amor, de partilha com o outro ou, pelo menos, de uma paixoneta de verão.

E foi mais ou menos na interseção desses sentimentos que eu, e mais três amigos, tivemos em tempos um restaurante. A ideia era que Aveiro tivesse um espaço onde se comesse e bebesse bem, utilizando os produtos das gentes da terra. Tudo num ambiente cosmopolita e descontraído. Acho que fomos bem-sucedidos em quase tudo. Mas uma relação, pelo menos uma que se quer longa, não vive só de amor. Vive de compromisso. De estar lá, nos dias bons e nos dias maus. É preciso, portanto, trabalhar muito para uma relação dar certo. Num restaurante é a mesma coisa.

Mas dou por mim a pensar: De onde vem esta minha paixão por restaurantes? É que a questão é mesmo essa, a minha paixão é mesmo por restaurantes, a comida é apenas uma parte da equação. Importante, sem dúvida, mas apenas uma das partes.

A culpa é dos meus pais. A culpa é sempre dos nossos pais, não é? Freud já o dizia.

Esta é, contudo, uma culpa boa. Passo a explicar, tenho a sorte de ter uns pais que viajavam muito e que me levavam com eles nessas viagens de longos dias, num carro sem ar-condicionado, pela Europa fora.

Num dia normal fazíamos centenas de quilómetros. Desmontava e montava tenda, comia uma sandes ou algo semelhante, ao almoço, e qualquer coisa quente no parque de campismo, no final do dia. Num dia normal via e ouvia o relato apaixonado do José Hermano Sar...desculpem, do meu pai, das inúmeras atrações histórico-arquitetónicas que os lugares nos ofereciam. Uma igreja de abóbadas romano-árabes-de-inspiração-barroca-ou-sei-lá-o-quê, um castelo semidestruído ou uma escavação arqueológica faziam quase sempre parte do menu do dia. O meu dia-a-dia era feito de pedra, muito pedra...

Mas nalguns dias, em dias especiais, íamos almoçar ou jantar fora. E depois de muitos dias a sandes e a comer com talheres de plástico, acreditem que essas refeições ficam gravadas na memória. E não era apenas o conforto duma refeição quente. Entrar num restaurante era por norma fazer uma visita guiada pela história e região dum país. Para o meu pai entrar num restaurante era uma oportunidade para falar com as pessoas de lá e conhecer os costumes e história da terra. Por isso entrar num restaurante era muitas vezes como entrar na casa de alguém. Alguém que nos abre as suas portas e nos conta as suas estórias e nos traz um prato de comida e um copo de vinho.

Por isso é que aquele jantar a altas horas, numa pequena vila portuária em Gironde, nunca me sairá da cabeça. Ou o jantar em Casablanca. E outros, muitos outros.

A minha paixão por restaurantes vem daqui, porque parte das minhas melhores memórias são de restaurantes. Não desses franchisados ou similares – nada contra – mas desses restaurantes com alma, onde a estória dos donos se confunde com a dos pratos e do sítio onde estamos.

Por isso sim, cozinhar para os outros é um ato de generosidade.

Os nossos restaurantes, aqueles que todos nós recordamos com carinho, pelas histórias que lá temos para contar, pela amizade que temos com os seus donos (como não gostar de quem nos traz comida?) pelo facto de nos receberem tão bem quando lá estamos com os nossos (amigos, família) estão em sério risco, são muitos meses de pandemia, de confinamentos.

Não há muito que possamos fazer para ajudá-los, mas o que sei é que o meu mundo seria um pouquinho mais cinzento sem restaurantes, sem os “meus” restaurantes.

Um abraço de força e coragem para todas as pessoas que têm ou trabalham em restaurantes neste período tão complicado.

* Colaborador
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