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São Gonçalinho, vamos todos em romagem!

Opinião

Virgílio António Nogueira

Agora que começa janeiro e com o início deste mês a ameaça costumeira das manhãs de geada, dos fins de dia carregados de humidade e com o frio a procurar insinuar-se no corpo defendido pela lã, agora que os vírus têm nas temperaturas baixas, a roçar os graus negativos, o clima para prosperarem e trazerem aos nossos organismos as dores de garganta, a tosse, a febre, os espirros, as reações físicas à sua perversidade. Por outro lado, o benigno, é também o tempo de S. Gonçalinho, a apaziguar as dores do inverno e a trazer-nos adentro da Capela aquecida, ao encontro da imagem que adoramos. São os dias de Festa a realizar em honra à obra espiritual e atribuídos à homenagem da bondade que o beato revelou com os desfavorecidos do seu tempo, às curas e aos alívios que trouxe aos desafortunados sofredores dos padecimentos reumáticos e ainda à capacidade que se lhe imputa de ajudar as senhoras, em especial as menos jovens, a desencantar o parceiro que as acompanhe nas jornadas vindouras.

A romaria ao templo hexagonal situado na beira-ria é a miragem de conforto, que se confirma real, no meio do deserto gélido dos primeiros 31 dias do ano, sensação que os tornam percebidos como os mais longos, se medidos pela fita métrica do aborrecimento. Curiosamente, a terceira segunda-feira de janeiro é designada pelos cientistas que estudaram o assunto como a Blue Monday, ou seja, o dia mais triste do ano.

O ser humano que desceu de Amarante até à nossa terra e aqui granjeou a admiração e a simpatia das gentes mantém perene a herança deste intervalo de alegria no mês mais difícil do ano. A boa emoção de trepar os degraus da escadaria estreita e sinuosa para chegar ao parapeito que circunda o topo do templo e dali lançar as cavacas, lavadas na calda açucarada, para os braços que se esticam no ar para as apanhar, replica os caminhos que São Gonçalinho percorreu para fazer chegar o pão aos que dele careciam para subsistir. As cerimónias religiosas complementam-se com canções de devoção e o arraial alarga-se à música profana e às bancas dos feirantes que dispõem os bolos de gema e as outras iguarias nos tabuleiros, de maneira a serem cobiçados pelos gulosos e os miúdos puxam os braços dos pais para os brinquedos coloridos à venda e que lhes reclamam a atenção e abrem a imaginação.

Este ano a iluminação da Festa terá uma sombra para todos os que recordam o Sr. João Carlos, terá uma lâmpada fundida, uma luz que deixou de brilhar, pois essa pessoa boa, Mordomo da Festa do Menino, nascido na Rua Dom Jorge de Lencastre, peça do coração grande dos festejos, e da cidade, deixou de viver entre nós. Perdemos um amigo, a sua morte foi um sorriso furtado a uma cara que esboçava simpatia e que vamos deixar de ver pelas ruas que atravessamos de cor. Ficamos mais sozinhos a partilhar o passado, a lembrar as marés que apenas nós conhecíamos, as da ria e as do mar, as festividades, as lendas do desporto e dos clubes que nos uniam, as dos leitos em que navegámos juntos.

Foste e serás João Carlos, pela escolha sábia e pela criatividade do Arquiteto Hélder Tércio, o rosto que reproduz O Mordomo, a figura moldada pelo garbo no uso do gabão castanho dos homens que laboram na safra do sal. Representas o orgulho de segurar o Ramo, o símbolo da responsabilidade que será passado com confiança e afeição ao futuro servo que cuidará da tradição e do amor à terra. A porcelana revela o contorno do teu rosto prazenteiro, mostra a simpatia genuína que te conhecemos, não a fisionomia do ator que se preparou com minúcia e artimanhas para ser a cara deste nosso canto. Ficaste imortalizado na maravilhosa obra da Vista Alegre, moras em lugar de destaque nas nossas casas, a viver connosco o dia-a-dia, não se trata de um pedaço de cerâmica na peanha: és a alma corporizada que traduz fielmente o que fomos e o que somos como aveirenses. O que seremos também quando os impostores se forem e ficaremos então nós e aquela amizade que vinda das infâncias não é interesseira, circunstancial, passageira. Contigo, sempre contigo, querido João Carlos. Não te esquecerei, estou seguro que não te esqueceremos. Este ano beberemos um dedal de licor de Alguidar para brindarmos à tua memória. Caia a chuva mais inclemente que o bairro da Beira-Mar jamais verá, sopre a nortada mais selvagem que nem aos idosos lembre, mesmo que uma proposta bizarra faça arremessar abóboras do espaço, podes contar com os teus amigos a recordar-te ali pelo Largo. Teremos connosco a tua extraordinária família, que tem esses valores bons da franqueza e da cortesia, e aqueloutra gente corajosa e dedicada aos outros, de que fizeste parte da história, os nossos Bombeiros.

Lembraremos igualmente, em 2023, a Ti Emília, a querida senhora Emilinha a quem a passagem dos anos reforçava a jovialidade e afinava a ironia e a boa disposição. A presença constante no interior da igreja já quase a santificara e o seu lugar no banco da ala direita era tido como um nicho de romagem e de confraternização amiga, calorosa e risonha.

A Festa está aí à porta, a Mordomia envolvida na azáfama para que tudo corra na perfeição, e assim será, depois de dois anos entristecidos pela pandemia a mais forte festa de Aveiro, do seu povo, da sua comunidade, oferece um programa eclético, atrativo para os diversos gostos musicais e inclui os rituais mais antigos e os incorporados recentemente e que aumentam a diversidade de atividades atinentes aos festejos. De 5 a 10 de janeiro as ruas adjacentes à Capela de São Gonçalinho estarão engalanadas, o Palhuça, o Augusto, o Telheiro, o Alicarius, o Bairro, atulhados de gente, nas mesas desses e de outros restaurantes os manjares e os néctares farão a felicidade dos convivas que recordam histórias e pessoas, que brindam à saúde e cantam a Marcha de São Gonçalinho, a Marcha do Mordomo que o Dr. Manuel Guerra compôs com a sensibilidade e o humor que o caracterizam e entoam um outro tema musical que alude a uma dança de mancos, de que se fala, sem que haja evidência de existir.

Que a Festa seja mais um momento feliz das nossas vidas, agradecendo-se a todos os que a tornam possível, os mesmos homens que durante o ano trabalharam fortemente em várias iniciativas que avivam o espírito do bairro e a sua interação com o sagrado e saudando-se as mulheres que cumpriram as tarefas indispensáveis como o embelezamento dos altares com as flores que antecipam a primavera.

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