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No meio da neblina

Opinião

Ivar Corceiro

Foi o meu pai que um dia me explicou porque é que Aveiro tem tantas vezes uma neblina matinal tão densa, que a mesma é a condensação junto à superfície do ar quente e húmido quando entra em contacto com a água da ria. Eu era criança e até esse momento tinha medo da névoa.

O meu pai partiu este ano e para mim essa densa névoa da manhã é agora também como um copo de mau uísque. Faz-se sentir em cada um dos canais da cidade onde vivo actualmente, onde a água suja corre como se fosse sangue a querer coagular lentamente. Mas não é só isso, embrulha todos os cantos das suas artérias escondendo-lhe as tristezas e fazendo de si mesma a tristeza mor.

Nunca acreditei que a névoa fosse um acaso. E enquanto caminho esta manhã pelos canais de Stoke On Trent, depois de uma noite lenta sem sono e a beber alguns copos de uísque barato reconheço-lhe os modos.

Um homem que solta os nós das cordas de um pequeno barco de madeira cumprimenta-me com o entusiasmo de um Marinheiro de Alto Mar que não via ninguém há meses. Mas ele não é isso. Na verdade está sempre ali e cumprimenta-me quase todas as manhãs da mesma forma.

Uma mulher passa por mim numa corrida matinal e agradece-me por eu me ter desviado para ela poder passar mais à vontade. A névoa engole-a à mesma velocidade que a revelou. Leva uns auscultadores com uma espécie de cobertura de lã, suponho que para lhe proteger as orelhas do frio que se faz sentir. Bom dia, respondo sabendo que ela não me pode ouvir.

Mais à frente um homem passeia dois cães que me vêm cheirar as calças. Que não mordem, diz ele. Os dois animais são iguais, pequenos e castanhos como se fossem a cópia um do outro. Provavelmente são irmãos, penso. Abanam a cauda contentes por me verem e respiram sofregamente enquanto lhes faço algumas festas. O dono chama-os como se tivessem algum encontro importante e estivessem com pressa.

É na névoa que me dou conta que deixei de olhar para o futuro há algum tempo. Esse futuro que eu esperei e sonhei quando era jovem já chegou e já se fez meu. É o meu presente, é o meu Agora e, não sendo o que esperei nem sendo o que sonhei, é que me faz sentir vivo. E como eu gosto de estar vivo e de me poder cruzar com outros vivos.

A névoa tem essa grande vantagem. Não nos permite ver a linha do horizonte. O que vemos é o que temos. O que vemos é o que estamos a viver e se há alguma coisa que aprendi neste meio século de vida foi a não esperar, a perceber que devo viver cada segundo desta vida tendo a percepção disso mesmo. Estou vivo.

Às vezes, quando mais ninguém surge do meio da neblina, vejo o meu pai a passar. É novo outra vez, aparentando ter um pouco menos de quarenta anos de idade. Ele aparece e desaparece tão depressa quanto um corredor matinal e sorri-me sem nunca dizer nada. Sou apenas eu quem lhe diz: “Olá pai!”

Gostava que ele me respondesse um dia destes, um qualquer. Se pudesse ter um desejo qualquer de Ano Novo, um qualquer, seria esse.

Fiquem todos bem!

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