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A páginas tantas: Daisy Jones and The Six

Opinião

Filipa Matias Magalhães*

Em dias tão duros como estes que vivemos, em que a divulgação do número (conhecido e provado…) de vítimas de abusos sexuais por parte dos membros da Igreja Católica nos tirou o sono a todos e pontuou de angústia e revolta os nossos dias, trago-vos uma sugestão de um livro leve e fácil de ler. Divertido e fluido, em que o amor e uma das formas mais bonitas de arte nos transportam para um lado mais alegre da vida.

Não sou pessoa de incendiar as redes sociais com mensagens de ódio e revolta, pois acho que o mundo já tem ódio a mais e esta cultura dos “influenciadores” da raiva, desgraça e ódio, em regra, não produz bons resultados. Mas quem comigo priva, sabe o quanto estas notícias me enojaram e revoltaram e que desejo para os seus autores uma dura pena e choro pelas vítimas, cuja dor nunca passará. Sou católica e, por isso mesmo, estes atos ainda me chocam e envergonham mais, pelo facto de terem sido perpetrados por quem, sob a aura e autoridade moral que a Igreja lhes reconhece, abusou indecentemente de quem estava ao seu cuidado ou em si acreditou. Para estes, como para todos os pedófilos e violadores, a pena só pode ser uma e os tribunais deverão ser céleres e justos na sua aplicação.

Negar esta situação é tão criminoso como os crimes em si e por isso é altura de assumir a realidade e deixar que os Tribunais decidam e condenem os criminosos em conformidade. Envergonho-me porque tenho a mesma fé que estas pessoas dizem ter, mas claramente somos diferentes, pois não aceitarei nunca crime nenhum que seja cometido sob a capa ou com a desculpa de uma religião, cultura ou qualquer outra justificação, mas não posso nem vou ceder à tentação de generalizar, pois as generalizações são demasiado perigosas e injustas.

Acho que, demonstrada a minha revolta, é autoexplicativa a razão pela qual escolhi o livro Daisy Jones and The Six, de Taylor Jenkins Reid, para vos trazer esta semana. Porque é um livro que fala de amor e de música e se o amor é a melhor arma para combater o ódio, a música traz beleza aos nossos dias e une as pessoas, tendo também o papel de dar voz às críticas à sociedade.

Daisy Jones and The Six, foi vencedor do prémio goodreads e faz-nos sentir que estamos a ler uma história verídica, de tão envolvente e bem contada que está.

Ler este livro faz de nós companheiros de viagem desta menina cheia de sonhos e talento, Daisy Jones, que cresce muito perdida e sem o acompanhamento dos seus pais, com apenas uma grande certeza, o seu amor pela música, a sua vontade de escrever as suas letras e lhe emprestar a sua voz rouca fabulosa.

A primeira personagem que nos é apresentada, é esta adolescente privilegiada, que nasceu numa família rica de Los Angeles, na qual sempre teve tudo, menos a atenção dos pais. Aliando esta ausência parental, a uma excessiva liberdade e à sua beleza estonteante, Daisy acaba por acreditar em quem não deve, e deixar-se arrastar para relações abusivas e de dependência de drogas. Acaba por se envolver com quem não deve e este é o início de um período – que felizmente teve fim – de autodestruição.

Curiosamente, apesar de muito bonita e ciente dessa beleza, Daisy recusa-se a considerar a beleza a sua melhor arma, e refere algumas vezes que “não quer ser a musa de ninguém” e não gosta como os homens tratam as mulheres. “Os homens costumam pensar que merecem um prémio por tratar as mulheres como pessoas.” Daisy quer, acima de tudo, escrever as suas músicas e cantá-las: este sim, o seu maior dom e o seu sonho, mas ninguém, nem os pais, nem o “produtor” acreditam nisso, no que reflete bem uma sociedade que não reconhecia nas mulheres a inteligência, o talento e o direito a crescerem por si e de forma independente.

Daisy ultrapassa, felizmente, este período de vícios e destruição – que simboliza tão bem os anos 70 – a vida louca dos bares noturnos, sexo com diferentes homens e abuso de drogas e álcool - e conhece Billy Dunne, um jovem vocalista e guitarrista que, juntamente com o seu irmão Graham fundaram a banda The Six, juntamente com Karen, Warren, Eddie e Pete, acabando por gravar um álbum que lhes traz o sucesso e os leva a muitas tournées.

Billy tem tanto de talentoso, como de autoritário e acaba por semear o mau estar na banda ao impor as suas opções e decisões aos outros membros, igualmente talentosos, que não querem esta manipulação e isso acaba por fazer com que a banda vá perdendo parte do sucesso alcançado, surgindo a oportunidade de incluir Daisy na banda como uma forma de a resgatar.

É neste ponto que a história cruza o talento e a vida de Daisy Jones, que apesar da sua fragilidade e período de drogas e comportamentos abusivos, acaba por se agarrar à música e à vida, com Billy que, também ele tendo passado pela experiencia louca das tournées, das grouppies, do sexo, álcool, medicamentos e drogas. A união dois surge, assim, como uma tentativa de salvar a banda, acabando eles os dois por também se salvar… a música uniu-os e salvou-os dando-lhes um propósito!

Apesar da leveza com que a história é escrita e da vida louca que retrata, este livro é também um importante testemunho do papel da mulher na sociedade. De facto, se ainda é difícil hoje, uma mulher fugir ao estereotipo que lhe definem - de dona de casa e mãe de família – e afirmar-se e vencer na profissão que escolheu para si, esta história mostra-nos que essa dificuldade era ainda maior, nos anos 70 e num mundo dominado quase exclusivamente por homens. “Quando estás numa situação como esta, a ser ameaçada por um homem, é como se tudo o que tivesses feito para chegar a esse momento — em que estás sozinha com uma pessoa em quem não confias - passasse diante dos teus olhos. Alguma coisa me diz que não é isso o que acontece com os homens. Quando eles estão ameaçam uma mulher, duvido que olhem para trás e revejam tudo o que fizeram para se tornarem uns imbecis. Mas deviam olhar para trás e perceber o que aconteceu.”

A relação de Billy e Daisy não foi fácil desde o início, pois se Billy sempre se tinha mostrado, na sua banda, muito autoritário e impositivo, Daisy era muito segura das suas letras e do que queria fazer e cantar e esta foi uma relação que, tendo iniciado com muita resistência, se foi limando ate ambos conseguirem trabalhar de forma harmoniosa. Billy cedeu e abrandou o autoritarismo faxe à determinação e resiliência, mas sobretudo ao talento de Daisy que o conquistou. “É o que procuramos na arte, não é? Quando alguém dá forma a algo que vive dentro de todos nos? Quando alguém nos tira um pedaço do coração e o mostra? É como se fossemos apresentados a uma parte de nós. Foi o que a Daisy fez com essa canção. Pelo menos, para mim.”

A verdade é que, por imposição de um ou de outro e, devido à cedência de ambos, as letras acabam por dar origem a músicas que, cantadas pelos dois, foram um sucesso sem precedentes, esgotando concertos e ocupando lugar de destaque na televisão e na radio.

O que mais gostei neste livro foram as descrições de uma época e contexto dos quais apenas sei o que leio nos livros e vejo nos filmes, de forma tão real e com tantos detalhes e pormenores que levam a crer que a banda existiu mesmo e que esta história de amor foi real.

Se me pedissem uma punchline sobre o livro diria que “a música é um excelente catalisador do amor” e, de facto, acho que esse foi o sentimento que todos tivemos quando em 2019, na cerimónia dos Óscares, ouvimos Lady Gaga e Bradley Cooper a cantarem "Shallow". Acho que todos vimos amor naquele olhar, não obstante Bradley Cooper ser, na altura, casado com a fabulosa Irina Shayk. Ora, se, no mundo da racionalidade, nenhum homem trairia uma mulher tão bonita, no mundo da música esse cenário coloca-se. E foi precisamente isso que aconteceu no livro, com a história de amor que nasceu entre Daisy e Billy (também ele casado quando começou a cantar com Daisy). Este é daqueles casos em que a linha entre a realidade e a ficção é ténue demais.

E no fim desta história louca e desta montanha russa de emoções, não podíamos ter melhor conclusão que esta: “A vida é isso, acho que. Quem segura a tua mão e quem escolhes para dar a tua! Eu costumava pensar que almas gêmeas eram iguais. Eu costumava pensar que deveria procurar alguém que fosse como eu. Não acredito mais em almas gêmeas e não procuro nada. Mas se eu acreditasse neles, acreditaria que sua alma gêmea era alguém que tinha todas as coisas que você não tinha, que precisava de todas as coisas que você tinha. Não alguém que sofre das mesmas coisas que você.”

Espero que esta leitura traga mais leveza e esperança aos vossos dias!

#bookgirl

* Escreve, regularmente, a crónica literária "A páginas tantas"
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